Aumento deliberado das tarifas, desvios de rotas, entrevistas e ausência de fiscalização municipal são alguns pontos que caracterizam o cenário vivido pela população que busca pelo transporte público na hora da ponta, tanto na Cidade de Maputo como na Matola. A medida que o relógio se aproxima das 15:30, por sinal hora que marca o fim do expediente da função pública, o cenário nas principais paragens da cidade de Maputo fica caótico, tudo por conta da má atuação dos transportadores.
No terminal do Zimpeto, por exemplo, o ambiente é de tensão, frustração e, sobretudo, desorganização. Passageiros, em fila ou à deriva, deparam-se diariamente com um “festival de irregularidades” protagonizado por operadores de transporte Semi-colectivo que, à vista de todos, ignoram as regras estabelecidas.
O ditado popular “quando os gatos saem, os ratos fazem a festa” nunca foi tão apropriado. Sem fiscalização visível por parte das autoridades, motoristas e cobradores impõem novas rotas e tarifas, aproveitando-se da elevada procura nos horários de ponta.
“Às 16h o chapa ainda cobra 20 meticais, mas às 17h30 já estão a exigir 50 ou mesmo 70, dependendo do destino. Se não pagarmos, eles dizem para esperarmos o próximo, que nunca se sabe quando vem”, conta Marcelina Tomás, empregada doméstica que faz diariamente o percurso Bobole-Baixa.
As alterações não autorizadas de rotas também são frequentes. “Hoje entrei num chapa para a Junta e, no meio do caminho, o motorista decidiu ir pela 25 de Setembro até ao Museu. Tivemos que saltar e procurar outro transporte”, relata Celso Mausse, técnico de informática.
Os passageiros denunciam ainda a cumplicidade silenciosa entre operadores e a aparente ausência de agentes de fiscalização nas horas críticas. “Durante o dia vemos a polícia e agentes municipais a controlar, mas ao entardecer, desaparecem. É aí que tudo muda. Parece que os motoristas já sabem que estão livres para fazer o que quiserem”, acrescenta Celso.
O problema não é novo. As queixas sobre o comportamento abusivo de alguns operadores, principalmente nos finais de tarde e fins-de-semana, têm sido recorrentes. No entanto, a falta de uma resposta eficaz por parte das autoridades agrava a situação.
De acordo com Mateus Cuna, porta-voz da Polícia Municipal, a instituição tem conhecimento da crise instalada no terminal do Zimpeto e em outras paragens da cidade, mas afirma que a falta de denúncias formais limita a sua capacidade de atuação.
“Não basta dizer que houve desvio de rota ou aumento da tarifa. Cada transporte tem uma rota definida e está identificado com matrícula. O munícipe deve fornecer essas informações no momento da denúncia”, explicou Cuna.
O porta-voz acrescentou ainda que os cidadãos podem usar a linha de apoio do comando da Polícia Municipal ou recorrer às associações dos transportadores para formalizar as queixas. “Só com denúncias concretas conseguimos agir de forma eficaz”, concluiu.
Especialistas em mobilidade urbana alertam que a situação pode agravar-se caso medidas estruturais não sejam implementadas. “Não se trata apenas de aumentar a frota, mas de criar mecanismos reais de controlo e responsabilização. É inadmissível que o passageiro continue a ser penalizado por um sistema que o deveria proteger”, defende Sara Matalana, antropóloga e especialista em mobilidade urbana sustentável.
Enquanto isso, os cidadãos continuam à mercê da sorte e do improviso. Para muitos, a volta para casa transformou-se numa prova de paciência e resistência, onde o respeito pelo direito à mobilidade segura e acessível é, muitas vezes, ignorado.
“Queremos apenas chegar em casa, mas somos tratados como se não tivéssemos escolha. E na verdade, não temos”, conclui Marcelina, visivelmente cansada, esperando há mais de uma hora por um transporte que aceite o valor regular.