Mais de 4.800 famílias vulneráveis do distrito de Magude, na província de Maputo, começaram a receber apoio financeiro do Governo moçambicano como forma de mitigar os impactos da seca e das chuvas intensas previstas para a época 2024-2025.
Trata-se de uma acção pioneira integrada no Programa de Apoio Social Directo – Acções Antecipadas (PASD-AA), lançado oficialmente no dia 10 de Junho, na localidade de Mapulanguene.
A cerimónia foi presidida pelo Secretário de Estado do Género e Acção Social, Abdul Razak Esmail Amuzá, que sublinhou a importância da antecipação na resposta a eventos extremos que, nos últimos anos, têm fustigado ciclicamente o território moçambicano.
“Moçambique enfrenta eventos climáticos extremos cada vez mais frequentes – como secas, ciclones e inundações. Precisamos actuar antes que o desastre aconteça. É isso que estamos a fazer com estas Acções Antecipadas”, declarou o governante, durante o lançamento da iniciativa que beneficiará, só em Magude, cerca de 4.850 agregados familiares.
A medida, inserida numa abordagem inovadora e preventiva no domínio da protecção social, visa garantir que os cidadãos mais vulneráveis tenham meios mínimos de subsistência assegurados antes do pico da crise climática. A lógica subjacente é a de reduzir perdas humanas, económicas e sociais através de intervenções programadas com base em avisos prévios meteorológicos e modelos de risco climático.
O PASD-AA representa uma das faces mais visíveis da operacionalização do Eixo 1 da Estratégia Nacional de Segurança Social Básica, que preconiza o fortalecimento da resiliência comunitária e o combate às desigualdades sociais em Moçambique.
De acordo com o Ministério do Trabalho, Género e Acção Social, a acção, além de Magude, contempla famílias vulneráveis nas províncias de Gaza, Inhambane, Sofala e Tete, alcançando um universo superior a 42 mil agregados familiares. As prioridades de elegibilidade incidem sobre:
Famílias chefiadas por mulheres
dosos sem suporte familiar ou acamados
Pessoas com deficiência física ou mental
Crianças que assumem a chefia de agregados
Famílias com menores em situação de pobreza extrema
Esta categorização reflecte uma visão de justiça social aliada a critérios de equidade e protecção dos grupos historicamente mais expostos à vulnerabilidade climática e económica.
Segundo fontes do sector, os montantes transferidos são calculados com base nas necessidades mínimas alimentares e de sobrevivência e ajustados consoante o número de membros do agregado familiar, permitindo maior impacto no curto prazo e incentivando boas práticas de gestão doméstica.
A adopção de intervenções antecipadas na área da protecção social marca uma viragem paradigmática na forma como o Estado moçambicano se posiciona perante as crises climáticas. Tradicionalmente, o apoio a vítimas de desastres naturais tem sido reativo, com respostas mobilizadas após o colapso dos meios de subsistência. Com o PASD-AA, o Governo aposta numa lógica de previsibilidade e prevenção.
Esta abordagem é suportada por dados climatológicos recolhidos em colaboração com o Instituto Nacional de Meteorologia (INAM) e entidades internacionais como a Organização Meteorológica Mundial, que possibilitam antever os impactos prováveis e desenhar acções com antecedência.
O uso de “gatilhos de acção antecipada”, activados por previsões de seca ou excesso de precipitação, permite mobilizar fundos de emergência e começar de imediato as transferências monetárias e acções de assistência comunitária. Estas incluem igualmente sessões de sensibilização sobre nutrição, saúde pública, boas práticas agrícolas e gestão de riscos.
Em Mapulanguene, a expectativa é alta entre os beneficiários. Maria L., de 62 anos, viúva e cuidadora de três netos, conta que nunca antes havia recebido ajuda antes da época de seca: “Quando o milho não cresce, só resta pedir esmola. Agora, com este dinheiro, vou comprar comida e guardar um pouco para medicamentos”, explica, com voz emocionada.
Outro beneficiário, João Manuel, chefe de um agregado com cinco filhos, considera que a transferência antecipada poderá ajudá-lo a evitar o desespero habitual da estação seca. “É a primeira vez que nos ajudam antes da fome. Sempre nos prometiam ajuda, mas vinha depois, quando já não havia nada nos currais nem nos campos”, refere.
Estes testemunhos refletem a relevância prática de uma política social alinhada com os ciclos reais da vida rural e com a dignidade humana.
A implementação do PASD-AA conta com o apoio técnico e financeiro de parceiros internacionais, incluindo agências das Nações Unidas como o Programa Mundial de Alimentação (PMA) e o UNICEF, além de organizações de desenvolvimento da União Europeia, Suécia e Alemanha.
A cooperação internacional tem sido essencial para o reforço das capacidades técnicas dos serviços distritais de Acção Social, bem como para o desenvolvimento de sistemas digitais de registo e pagamentos móveis. Tais avanços garantem maior transparência, rastreabilidade e rapidez nas transferências.
O compromisso governamental com esta abordagem reflete também o alinhamento com as metas globais da Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável, em especial os Objectivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) 1 (Erradicação da Pobreza), 2 (Fome Zero) e 13 (Acção Climática).
Apesar dos avanços significativos, o Ministério reconhece que o alcance das Acções Antecipadas ainda está aquém das necessidades nacionais. Com mais de 60% da população moçambicana a viver em zonas de risco climático, há ainda milhões de famílias expostas a eventos extremos e com pouca ou nenhuma cobertura social.
A expansão do programa dependerá do reforço do orçamento nacional, da sustentabilidade do apoio dos doadores e da consolidação de um sistema integrado de gestão de riscos e resposta humanitária.
Abdul Razak Esmail Amuzá considera, no entanto, que o importante é dar o primeiro passo: “Estamos a mudar a lógica da protecção social em Moçambique. Estamos a passar da reacção para a antecipação. O futuro da assistência social está aqui, e é urgente.”
Ao lançar as Acções Antecipadas em Magude, o Governo envia uma mensagem clara de que proteger os mais vulneráveis antes do desastre não é apenas uma boa política – é uma exigência de justiça social, planeamento estratégico e solidariedade institucional.