A Ministra das Finanças, Carla Loveira, defendeu, na manhã desta segunda-feira (16), uma abordagem gradual, prudente e tecnicamente sustentada para a liberalização da conta capital em Moçambique, sublinhando os riscos de volatilidade financeira e instabilidade cambial caso o processo decorra de forma precipitada e sem coordenação.
A declaração foi feita durante a abertura oficial das XVI Jornadas Científicas do Banco de Moçambique, realizadas no Centro Internacional de Conferências Joaquim Chissano, sob o lema “Liberalização da Conta Capital em Moçambique e os Desafios da Gestão Macroeconómica”.
No seu discurso, Loveira realçou a importância do encontro como um espaço privilegiado para a investigação aplicada e o debate técnico-científico sobre temáticas de elevada complexidade económica, salientando a sua relevância num contexto histórico em que o país celebra os 45 anos do Metical e homenageia as vítimas do massacre de Mueda, ocorrido em 1960.
Segundo a governante, a liberalização da conta capital — processo que permite a livre movimentação de capitais entre fronteiras — deve ser conduzida em alinhamento com os objectivos macroeconómicos nacionais, inserindo-se nas estratégias do Governo para fomentar um ambiente de negócios mais favorável, aumentar a competitividade da economia e reforçar a resiliência frente a choques externos.
“O processo deve ser gradual e cuidadosamente calibrado, tendo em conta as especificidades da nossa economia, os riscos de volatilidade dos fluxos de capitais, a necessidade de robustecer as instituições e de garantir a articulação eficaz entre as políticas fiscal, monetária e cambial”, frisou Loveira, apontando a discussão promovida nas jornadas como contributo essencial para uma tomada de decisão informada.
O Governador do Banco de Moçambique, Rogério Zandamela, reafirmou o papel do banco central como autoridade monetária e cambial, destacando que a actual legislação cambial confere à instituição a prerrogativa de liderar, de forma faseada, o processo de liberalização. “Já foram liberalizadas algumas transacções, incluindo operações de investimento directo estrangeiro e de empréstimos externos, sempre com base numa avaliação criteriosa das condições do país e do contexto internacional”, explicou.
Zandamela considera que uma abertura cuidadosa da conta capital pode servir como catalisador para a integração de Moçambique nos mercados financeiros globais, com impacto positivo no investimento directo estrangeiro, transferência de tecnologias e competências, além de uma maior competitividade do sistema financeiro nacional.
O evento decorre num momento de significado simbólico, coincidindo com as comemorações dos 45 anos do Metical e o cinquentenário da independência nacional, a celebrar-se em 2025.
Um dos pontos altos das jornadas foi a participação de Michael Atingi-Ego, Governador do Banco de Uganda, que partilhou a experiência do seu país no processo de liberalização cambial ao longo das últimas três décadas.
Atingi-Ego enfatizou a necessidade de ancorar a liberalização em reformas macroeconómicas estruturais, advertindo que “sem estabilidade fiscal, disciplina monetária e controlo inflacionário, os riscos podem superar os benefícios esperados”.
Durante o evento, foram premiados três estudos académicos que abordam a interacção entre mobilidade de capitais e estabilidade macroeconómica em Moçambique.
O primeiro, da autoria de Estevão Mboana, intitula-se “Análise da Autonomia da Política Monetária sob Liberalização da Conta Capital”.
O segundo, elaborado por Sharmila Cumbana e Hilário Muchabel, analisa o impacto da mobilidade de capitais na eficácia da política monetária entre 2000 e 2023.
O terceiro, de Moisés Nhanombe, aplica o método ARDL para estudar a relação entre liberalização e estabilidade cambial.
Num gesto simbólico de reconhecimento histórico, a Ministra das Finanças recebeu das mãos do Governador Zandamela uma moeda comemorativa dos 45 anos do Metical, acto que assinala a importância da soberania monetária para o desenvolvimento do país.
Jamal Omar, Administrador do Banco de Moçambique com o pelouro da Estabilidade Monetária, encerrou o evento destacando a qualidade dos debates e dos contributos científicos apresentados, ao mesmo tempo que revelou o tema da próxima edição, marcada para 2026: “Regulamentação e Utilização da Inteligência Artificial no Sistema Financeiro Nacional: Riscos e Incertezas”.
As XVI Jornadas Científicas contaram com a participação de representantes do Governo, ex-governadores do Banco de Moçambique, membros do Conselho de Administração, académicos, analistas económicos, instituições de crédito, centros de investigação e organismos internacionais.
O evento foi unanimemente considerado um marco para a promoção do debate económico e da formulação de políticas baseadas em evidências, num momento em que Moçambique busca um posicionamento mais estratégico no xadrez financeiro global.