O Tribunal Administrativo (TA) reconheceu recentemente a existência de dificuldades na interpretação uniforme de determinadas leis, situação que tem originado decisões distintas em casos semelhantes.
Segundo o porta-voz do TA, juiz conselheiro Cláudio Pene, “na prática, há aspetos cuja interpretação varia de juiz para juiz, de aplicador para aplicador”. Esta declaração revela uma preocupação central: a falta de coerência pode minar a confiança no sistema judicial e criar incertezas no cumprimento da lei.
De acordo com Pene, a instituição pretende estudar minuciosamente a legislação em vigor, identificar os pontos que mais suscitam dúvidas e propor mecanismos que conduzam a uma aplicação mais harmonizada.
O objetivo é claro: assegurar que os juízes do TA e outros aplicadores da lei partilhem uma visão comum, evitando contradições que possam fragilizar o Estado de Direito e abrir espaço para contestação social.
Num contexto em que a justiça é chamada a desempenhar um papel fundamental na fiscalização da gestão pública, a uniformidade de interpretações torna-se essencial para garantir previsibilidade e justiça nas decisões.
Especialistas em direito defendem que a falta de coerência pode ter impactos profundos, desde a insegurança jurídica até à dificuldade de investimento estrangeiro, uma vez que a previsibilidade das decisões judiciais é um dos pilares da confiança económica.
Outro ponto relevante é a necessidade de reforço da formação contínua dos magistrados, de forma a assegurar que todos acompanham as mudanças legislativas e partilham critérios técnicos uniformes.
Na prática, isso poderá significar a realização de conferências internas, debates jurídicos e até a publicação de manuais de interpretação, capazes de guiar os magistrados em casos de maior complexidade.
Além da harmonização interna, o esforço do TA pode ainda abrir caminho para um diálogo mais amplo com outras instâncias judiciais, como os tribunais judiciais e o Conselho Constitucional, garantindo consistência entre diferentes esferas de aplicação da lei.
A preocupação com divergências interpretativas não é exclusiva de Moçambique; trata-se de um fenómeno comum em sistemas jurídicos onde a legislação contém lacunas ou ambiguidades, exigindo maior intervenção dos tribunais superiores.
No entanto, no caso moçambicano, o momento é particularmente sensível, dada a importância crescente do TA na supervisão da legalidade da gestão de recursos públicos e na fiscalização financeira do Estado.
Para os cidadãos, a expectativa é que a iniciativa do TA resulte numa justiça mais clara, acessível e confiável, capaz de proteger os direitos e, ao mesmo tempo, responsabilizar de forma eficaz a administração pública.
Em última análise, a harmonização de entendimentos não se resume a uma questão técnica, mas representa um passo essencial para consolidar a credibilidade das instituições judiciais e fortalecer o pacto de confiança entre o Estado e a sociedade.








