Cinquenta e dois anos depois da sua primeira participação, o Haiti garantiu uma vaga para o Campeonato do Mundo de 2026 ao derrotar a selecção da Nicarágua por duas boas a zero, na última terça-feira, num feito histórico que interrompe décadas de ausência.
Porém, a celebração desportiva contrasta com uma realidade profundamente dramática: o selecionador francês, Sébastien Migné, conquistou este marco sem nunca ter pisado o país que dirige. A extrema insegurança em Porto Príncipe, dominada por gangues armados, e a suspensão dos voos internacionais tornaram qualquer deslocação impossível.
Migné, no comando da seleção há 18 meses, viu-se obrigado a orientar a equipa à distância, numa abordagem inédita no futebol de alta competição, desafiando normas e expectativas tradicionais.
O Haiti, com cerca de 12 milhões de habitantes, ainda enfrenta as consequências do devastador terramoto de 2010 e vive num contexto de precariedade extrema. Mais de metade da população enfrenta risco severo de fome, enquanto grupos criminosos controlam vastas áreas da capital e das periferias.
Segundo a agência Reuters, a prolongada crise política e social o país não realiza eleições desde 2016 já forçou mais de 1,3 milhões de pessoas a deslocarem-se internamente. Muitos sobrevivem graças ao acolhimento de familiares ou em campos de abrigo temporários, numa tentativa de escapar à violência endémica.
Neste cenário, a qualificação para o Mundial surge como um raro momento de unidade e esperança, proporcionando à população exausta um motivo de celebração e um escape emocional face à adversidade diária.
O sucesso da seleção haitiana, alcançado apesar de limitações logísticas e sociais extremas, evidencia o talento e a resiliência dos jogadores, bem como a capacidade de adaptação de uma equipa forçada a competir longe do seu território.
A história de Migné, estratega à distância, ficará registada como um episódio singular na história das qualificações para o Mundial, demonstrando como o futebol pode transcender o desporto e tornar-se um símbolo de determinação e orgulho nacional mesmo em tempos de crise.








